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Quem são os donos da crise mundial

Linha fina
Problemas financeiros que ameaçam países hoje são causados por grandes corporações que controlam a economia mundial, oligopólio formado em grande parte por bancos, segundo economista Ladislau Dowbor
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São Paulo – “Temos todo o necessário hoje para construir um mundo que faça sentido. O problema não é falta de recursos, é falta de governança.” Assim o economista Ladislau Dowbor, professor da PUC São Paulo, iniciou palestra que denunciaria os verdadeiros responsáveis pela crise econômica mundial: “A totalidade das chamadas commodities – grãos, petróleo, gás e minérios – está nas mãos de 16 tradings globais”, disse ao referir-se à brutal queda nos preços desse segmento nos últimos 12 meses. “Quando se pensa que os principais bens do planeta estão com 16 corporações, vemos que há um controle na economia mundial sem que se tenha um governo mundial.”

E citou estudo do Instituto Federal Suíço de Pesquisa Tecnológica que aponta: 737 empresas controlam 80% do sistema corporativo mundial. “Isso é gente que se conhece, nem precisa se procurar para conspirar. Trata-se de um verdadeiro oligopólio planetário, e 65% desse sistema corporativo é formado por bancos.”

Para o professor, esse controle e financeirização da economia gerou uma dinâmica que hoje multiplica um sistema de quebradeira nos mais variados países: “O que hoje está acontecendo na Grécia, antes aconteceu no sudeste asiático, e antes disso no México, e também já aconteceu na Argentina”.

Com essa introdução sobre economia mundial, o professor abordou os Desafios à consolidação do estado social democrático na América Latina, tema em debate na tarde de terça-feira 25, no III Congresso Internacional de Ciências do Trabalho, Meio Ambiente, Direito e Saúde, realizado pela Fundacentro, Alal (Associação Latinoamericana de Advogados Laboralistas) e Ministério Público do Trabalho (MPT), que ocorre na Faculdade de Direito da USP até sexta-feira 28.

Também participou da mesa o ex-ministro de Relações Internacionais do governo Lula, o diplomata Celso Amorim.

> Celso Amorim: 'autonomia da América Latina está ameaçada'
> Veja aqui a programação completa do Congresso

“Contribuição” dos bancos – Ladislau Dowbor destacou o papel dos bancos na crise brasileira, a partir de dados do Banco Central sobre o endividamento das famílias: em 2005 correspondia a 19,3% da renda, em abril de 2015 pulou para 46,5% da renda. “Isso trava a economia”, argumentou, lembrando os exorbitantes juros bancários no país. “Um crediário no Brasil tem 100% de juros, na Europa é 13%. O rotativo do cartão de crédito alcança em média 300% ao ano. O cheque especial no Brasil chega a 200% ao ano, enquanto que na Espanha é 0% até seis meses. Hoje temos mais de R$ 20 bilhões empatados em dívidas de gente que está pagando cheque especial. Ou seja, crediários, cartões de crédito e juros bancários para pessoa física travam a demanda, pois o comprador paga em dobro pelo produto, assim endivida-se muito comprando pouco.”

Também criticou os altos juros para pessoas jurídicas e enfatizou: “Para completar esse quadro, a alta da Selic provoca a transferência de centenas de bilhões dos nossos impostos para os bancos, o que trava a capacidade do Estado de investir em infraestrutura e expandir políticas sociais”, disse, referindo-se aos títulos da dívida pública, indexados pela Selic. “Assim completa-se o quadro dessa bandidagem absolutamente fenomenal que está drenando recursos do nosso país”.

Interesses na crise – Dowbor lembrou os avanços sociais que o país teve nos últimos anos, com o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) crescendo 31% entre 1980 (0,549) e 2011 (0,718), desempenho que foi puxado pelo aumento na expectativa de vida (de 62,5 anos para 73,5 anos), pela melhora na média de anos de escolaridade (4,6 anos a mais) e pelo crescimento da renda nacional bruta per capita (quase 40% entre 1980 e 2011). “E vamos dizer que o país está quebrado?”, questionou.

“Os resultados são gigantescos, muito sólidos, essa crise não é uma crise econômica, é uma crise levada por interesses políticos. Temos uma aliança do sistema financeiro, da mídia e de parte do Judiciário. E não vamos nos esquecer do Congresso que é eleito por corporações, por isso temos a bancada ruralista, a dos bancos, a das empreiteiras, das montadoras... fica-se à procura da bancada do cidadão.” E completou. “Tivemos isso em 54 (ano em que Getúlio Vargas se suicidou). Tivemos também em 64 (ditadura militar) e estamos tendo isso de novo hoje. Não passa pela goela das nossas oligarquias que haja uma democracia, e isso não só nos ameaça aqui, como nos ameaça no continente latino-americano e no mundo.”


Andréa Ponte Souza – 26/8/2015
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