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TST decide que lei prevalece sobre acordo coletivo

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Decisão refere-se a caso específico sobre a qual ainda cabe recurso; em outro julgamento, ministro do Supremo reverteu sentença semelhante; reforma trabalhista proposta pelo governo Temer quer legalizar prevalência do negociado sobre o legislado, podendo sacramentar o fim de direitos consolidados
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Redação Spbancários, com informações do TST e do Valor Econômico
27/9/2016


São Paulo – O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que, em pelo menos um caso específico, as leis trabalhistas prevalecem sobre o acordo coletivo. Por maioria dos votos, o pleno afastou cláusula sobre pagamento de horas de deslocamento (in itinere). Foi a primeira vez que o colegiado se manifestou sobre o tema polêmico.

A maioria dos ministros decidiu que a autonomia negocial coletiva não é absoluta e que os precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) em sentido contrário não se aplicariam ao caso concreto. Eles entenderam que, no processo analisado, a cláusula deveria ser afastada por não ter apresentado contrapartida benéfica aos trabalhadores.

O julgamento implicou a Usina de Açúcar Santa Terezinha, cujo acordo coletivo limita o número de horas de deslocamento e estabelece natureza indenizatória para o pagamento – sem repercussão em férias, FGTS, 13º salário, contribuições previdenciárias ou Imposto de Renda. A empresa ainda poderá recorrer da decisão ao STF.

O julgamento do TST ocorreu depois de duas decisões do STF que davam prevalência ao acordo coletivo sobre as leis trabalhistas. O mais recente, há duas semanas, quando o ministro Teori Zavascki conferiu validade a acordo coletivo que suprimiu horas in itinere numa usina em Pernambuco. Por maioria, o Pleno do TST entendeu que os precedentes do STF não se aplicam ao caso da Usina Santa Terezinha.

Temeridade – O processo foi colocado em pauta também em meio à ameaça de uma reforma trabalhista prejudicial ao trabalhador pretendida pelo governo Temer. Uma das medidas aventadas determina que os acordos coletivos tenham mais força do que a legislação.

Durante o processo, o ministro João Oreste Dalazen afirmou ser “uma temeridade” dar validade a cláusulas de acordo coletivo de trabalho ou convenção que meramente suprimam direitos trabalhistas, “ante a notória debilidade da maioria das entidades sindicais brasileiras”. A seu ver, isso implicaria “um retrocesso histórico, um verdadeiro desmonte do Direito do Trabalho, que voltaria praticamente à estaca zero da concepção civilista do pacta sunt servanda”, ou da força obrigatória dos contratos.

O relator, ministro Augusto César Leite de Carvalho, votou contra a cláusula negociada. Para ele, a jornada de trabalho é um direito indisponível por envolver a dignidade da pessoa humana e medicina e segurança do trabalho. Além disso, o relator questionou negociação feita sem cláusula compensatória e defendeu que a autonomia negocial coletiva não dá poder para alteração de natureza de parcela – de indenizatória para remuneratória.

“Uma coisa é flexibilizar o cumprimento das leis trabalhistas e valorizar a negociação coletiva. Outra, muito diferente, é dar um sinal verde para a pura e simples redução de direitos, contrariando a natureza e os fundamentos do Direito do Trabalho”, destacou Dalazen. “No caso, não houve concessão de vantagem compensatória alguma para a supressão da natureza salarial das horas in itinere. Este é um fator relevante de distinção que autoriza a negar provimento aos embargos”.

O caso – Na reclamação trabalhista, um trabalhador rural alegava que o deslocamento, em transporte da empresa, da cidade de Mariluz (Paraná), onde morava, até as frentes de trabalho levava cerca de uma hora na ida e uma hora na volta.

Segundo apontou, os trabalhadores não tinham local fixo para realizar suas atividades, pois trabalhavam nas fazendas da usina e mudavam de local constantemente, e que “nunca sabia onde iria trabalhar no dia seguinte”. Sustentou ainda que, além de não existir linha regular de ônibus, o recolhimento de trabalhadores rurais na região se dava em pontos e horários predeterminados, e por imposição do empregador. Por isso, pedia o pagamento das horas in itinere como tempo trabalhado, e seus reflexos nas demais parcelas.

A empresa, na contestação, afirmou que as horas de trajeto foram pagas com base nos acordos coletivos firmados com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz, sendo, portanto, “vedada qualquer apreciação judicial”.

A condenação ao pagamento das horas pela Segunda Turma seguiu o entendimento consolidado no item V da Súmula 90 do TST, que assegura a remuneração das horas in itinere com o adicional horas extras de no mínimo 50%, previsto no inciso XVI do artigo 7º da Constituição da República.
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