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Tecnologias beneficiam bancos, não trabalhadores

Linha fina
Avanço do uso de meios virtuais nas transações financeiras foi abordado durante mesa sobre emprego e reestruturação produtiva, que abriu a 16ª Conferência Nacional dos Bancários
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Atibaia – O painel sobre Emprego e Reestruturação Produtiva abriu os debates da 16ª Conferência Nacional dos Bancários, iniciada na manhã da sexta-feira 25, em Atibaia, município de São Paulo.

Uma das palestrantes, a diretora do Sindicato e pesquisadora do Centro 28 de Agosto, Ana Tércia Sanches, abordou o uso das novas tecnologias nas transações bancárias e as consequências disso para trabalhadores e clientes.

“Hoje, com apenas um clique no computador, o cliente tem acesso a uma verdadeira agência bancária. Pelo celular também já é possível pagar contas, fazer transferência, agendar um pagamento... As novas tecnologias, que avançam a cada dia, facilitaram a vida de todo mundo?” Para a dirigente, no caso do sistema financeiro nacional, todas essas novidades só beneficiaram os bancos.

Especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo pela Unicamp e doutoranda em Sociologia pela USP, Ana Tércia apresentou um cenário sombrio para o emprego da categoria diante das novas tecnologias.

“Não somos contra o avanço tecnológico, todas essas novidades são muito boas. Só que os bancos se apropriam delas, cortam custos, aumentam seus lucros e não repassam nada para a sociedade”, disse.

O futuro dos bancários – Segundo Ana Tércia, em cinco anos os canais tradicionais de atendimento – que precisam do trabalho humano – serão reduzidos a um quarto de todo o atendimento feito pelos bancos. Em pouco tempo, não haverá mais caixas. “Os próprios bancos admitem que vão exterminar boa parte do emprego dos bancários apenas eliminando os caixas.”

As áreas administrativas também têm espaço para serem reduzidas – em 80% conforme estimativas dos próprios bancos. “Já temos uma série de cargos extintos ou em vias de extinção, como os compensadores, digitadores, escriturários, analistas de processos...”, comentou Ana Tércia.

Além de exterminar o emprego, as novas tecnologias utilizadas pelos bancos também estão acabando com a saúde dos seus empregados. “Tem intensificado o ritmo de trabalho. Pelo celular, trabalhamos no trânsito, em casa. Até a pressão por produtividade aumentou e tudo isso tem acabado com a saúde física e mental dos bancários. Essas questões precisam ser bem discutidas durante a Conferência Nacional.”

E os clientes? – “Hoje, os clientes fazem boa parte dos serviços que antes eram destinados aos bancários, mas continuam pagando altas tarifas e taxas pelo trabalho que ele mesmo executa”, enfatizou Ana Tércia.

Além disso, ainda há toda uma geração que tem dificuldade em acessar o atendimento eletrônico, além daqueles que preferem o atendimento pessoal. “Mas os clientes estão perdendo esta opção. Hoje, é estratégico para os executivos dos bancos eliminar os clientes de baixa renda, que são praticamente expulsos das agências, empurrados para os correspondentes bancários, que atuam sem qualquer segurança.”

Menos empregos – O impacto da automação também foi abordado pelas técnicas do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) Barbara Vasquez e Vivian Machado.

Segundo Barbara, no final da década de 1990 se deu a conclusão do processo de automação bancária,  que teve como principal impacto cortes de emprego e terceirizações, gerando intensificação profunda na rotina de trabalho.

A partir de 2011, os bancos passaram a investir ainda mais em tecnologia e na expansão dos correspondentes bancários para combater o crescimento da oferta de trabalho. Segundo o Dieese, 34.466 postos de trabalho já foram cortados por cinco grandes bancos do país, desde março de 2011.

Essa é uma tendência que tem se mantido em 2014. Barbara citou dados da última pesquisa sobre emprego bancário divulgada pela Contraf-CUT e Dieese, no dia 18 de julho, com base nos números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho, que aponta saldo negativo de 621%. O único banco a destoar nesse cenário é a Caixa Federal.

Quinta onda – O cenário atual do sistema financeiro é definido pelas técnicas do Dieese como a “quinta onda” de inovação bancária, marcada por meios eletrônicos de pagamentos.

Com 273 milhões de celulares habilitados no Brasil, os bancos estão apostando na plataforma mobyle pyament, que viabiliza os meios eletrônicos de pagamentos. “Inclusão financeira não é o mesmo que bancarização. O objetivo deste modelo é tirar o papel moeda de circulação”, alertou Vivian Machado.

Segundo ela, alguns bancos já lançaram, em parceira com operadoras de telefonia móvel, vários serviços de transações móveis. Através de aplicativos de smartphone já é possível fazer, por exemplo, compensação de cheque via celular.

Para ela, o grande desafio, hoje, dos trabalhadores do sistema financeiro é como lutar contra o avanço desse processo.

Terceirização – Outro palestrante, o juiz trabalhista Grijalbo Fernandes Coutinho apresentou um panorama sobre a precarização do trabalho no mundo e lançou, ao movimento sindical, um desafio: “O trabalho tem que fazer sua parte, porque o capital está fazendo a dele”.

Ele se referia à perda de direitos com a terceirização que, ampliada para a atividade-fim, como quer o empresariado brasileiro, fragilizaria ainda mais o trabalho e a organização sindical. “O que está em jogo não é só a redução da força de trabalho, mas um projeto político de massacre do trabalhador”, disse.

Segundo o juiz, não é um projeto novo.  Esse cenário teve início nos anos 1950, no Japão, e se refletiu no resto do mundo a partir da década de 1970. Suas bases estão na subcontratação, terceirização e captação da subjetividade do trabalhador por meio da falsa ideia de que a empresa pertence a todos. Acentua-se, globalmente, com a introdução de novas tecnologias, fusões e incorporações e progressiva quebra na rigidez dos contratos.

Segundo Grijalbo, os impactos deste projeto em um país como o Brasil são ainda mais danosos ao trabalhador. “Trata-se de uma economia capitalista dependente com raízes em um modelo escravagista colonial, no qual as estruturas arcaicas foram mantidas, aprofundando as desigualdades e a exclusão social.”

Os efeitos da precarização são, portanto, maiores:  atualmente são 90,1 milhões de empregados no Brasil, mas os trabalhadores informais, ainda que tenham diminuído, somam mais de 14 milhões. Outros 41 milhões de trabalhadores têm ocupações precárias.

Mesmo entre os trabalhadores formais, a imensa maioria sofre com a precarização salarial, entre eles os terceirizados. “Cada vez mais, o trabalho vem sendo esvaziado de sua centralidade para ser ocupado por um subproletariado. O número de correspondentes bancários, por exemplo, passou de 14 mil, em 2000, para 405 mil”, afirma o juiz. E completa: “A ampliação da terceirização para a atividade-fim significa um golpe de morte no direito trabalhista. Se isso acontecer, a Constituição Brasileira deixa de valer para os trabalhadores”.

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Rede de Comunicação dos Bancários - 25/7/2014
 

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