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Bancos públicos impediram país de ir à bancarrota

Linha fina
Ex-presidente Lula observa papel 'extraordinário' de BB, Caixa e BNDES para equilíbrio do mercado, pós 2008. Para professor da Unicamp, 'visão estreita' de proposta de Aécio para o setor é preocupante
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São Paulo – Os candidatos à presidência da República que disputam o segundo turno, Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), têm propostas antagônicas para a condução da economia no país. O papel dos bancos públicos é um exemplo. O governo Dilma Rousseff fala em dar continuidade à política de mantê-los como instrumento estrutural da economia e a metas de crescimento do país. Enquanto a redução da importância das instituições financeiras sob controle do Estado é defendida pelo economista Armínio Fraga, porta-voz da área econômica do candidato Aécio Neves.

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Em entrevista à edição de outubro da Revista do Brasil, que circula nesta semana, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva lembrou que os governos do PSDB queriam privatizar os bancos. No entanto, destacou que essas instituições foram essenciais no enfrentamento da crise de 2008. “Quando estourou a crise em 2008, numa conversa que tive por telefone com o presidente Obama, comecei a mostrar que seria importante que nos Estados Unidos tivesse um sistema financeiro mais ou menos igual ao nosso, que temos bancos públicos fortes, e temos bancos privados fortes. O Banco do Brasil, a Caixa, o BNDES não deixaram este país entrar na bancarrota. Eles querem acabar com eles. Na nossa visão de Estado, os bancos públicos têm um papel extraordinário de equilíbrio no mercado financeiro”, enfatiza Lula.

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Lula se refere a uma declaração recente do “candidato a ministro da Fazenda”, Armínio Fraga, de que “essa área precisa de uma correção de rumo” e que “vai chegar (num eventual governo Aécio) num ponto em que talvez eles (os bancos públicos) não tenham tantas funções. Não sei muito bem o que vai sobrar no final da linha, talvez não muito”, conclui.

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Bancos oficiais - As diferenças de desempenho dos bancos mencionados entre os anos de governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e os de Lula e Dilma ilustram essas visões distintas. No último ano de FHC, o volume de crédito movimentado por BB e Caixa chegava a R$ 130 bilhões, com queda de 69% nas operações da Caixa e de 6% nas do BB em relação ao seu primeiro ano de governo. No balanços de 2013, somente os dois maiores bancos públicos somaram pouco mais de R$ 1 trilhão em crédito, tendo o BB aumentado em 499% o seu volume e a Caixa, em 1.157%, em relação ao final do governo FHC. Isso sem comprometer o retorno de dividendos ao seu principal controlador, o Estado: os lucros somados do BB e da Caixa saltaram de R$ 6,7 bilhões em 2002 para R$ 22,5 bilhões em 2013. Todos esses valores são atualizados pelo IPCA do período.

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Do sistema - Para o economista André Biancarelli, professor do Instituto de Economia da Unicamp, essa sinalização de Armínio Fraga é preocupante: “Delegar as tarefas do financiamento do desenvolvimento às forças de mercado nunca deu certo no Brasil, nem em lugar nenhum do mundo, desenvolvido ou em desenvolvimento”, alertou, em entrevista a Marilu Cabañas na Rádio Brasil Atual.

> Áudio: ouça a entrevista de Biancarelli a Rádio Brasil Atual

O professor afirma que “tanto do ponto de vista do crescimento quanto das transformações que aconteceram na economia brasileira, que são ainda insuficientes, é impossível separar isso da atuação do BNDES, da Caixa Federal, do BB e todos os fundos constitucionais de direcionamento de crédito”.

Biancarelli destaca que sem a exigibilidade de que um percentual dos depósitos em caderneta de poupança, em bancos públicos ou privados, seja destinado ao financiamento da habitação, tendo a Caixa como principal organizadora desse sistema, seria muito difícil pensar em um programa do tamanho do Minha Casa, Minha Vida. Ele assinala, ainda, a importância da atuação dos bancos públicos para o financiamento da agricultura familiar, ao assumir riscos que fogem da lógica do capital privado, situação semelhante no financiamento a longo prazo para grandes obras de infraestrutura.

“É impossível pensar em um programa de infraestrutura, do tamanho que o Brasil precisa, sem a atuação do BNDES. Em todos os exemplos, o caráter público, o caráter não guiado pela lógica de ganho de curto prazo, que é a característica do setor privado, é fundamental”, ressalta.

O professor lembra que os bancos públicos foram importantes na estratégia de redução de juros: “Os bancos privados resistiram e o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal foram utilizados como instrumentos de concorrência de política financeira, e obrigaram os banqueiros a reduzir os juros, à margem de lucratividade.”

André Biancarelli considera Armínio Fraga portador de “qualidades como economista, mas um representante do sistema financeiro privado, não esconde de ninguém. São esses os interesses que ele representa”.


Rede Brasil Atual - 20/10/2014

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